terça-feira, 29 de setembro de 2009

vida em par

Depois desta campanha de prevenção do Cancro da Mama, deparei-me com esta outra, de uma revista holandesa chamada Pink Ribbon, também contra a doença.

A outra subvertia os padrões associados à doença, veiculando a mensagem de que as mamas são para se gostar e para se cuidar, e esta volta a recolocar o cerne da questão, propondo uma abordagem diferente. Não tão bem humorada e cómica, mas igualmente original.
Gosto sobretudo desta ideia de humanizar as mamas, como se fossem um par que deve viver inseparavelmente, trazendo consigo memórias comuns e histórias que só elas podem contar. Além disso, a campanha (principalmente a parte gráfica) está visualmente muito bem feita. Sem ser tão disruptiva como a primeira, é no entanto muito eficaz a transmitir esse valor insubstituível das mamas.






segunda-feira, 28 de setembro de 2009

um novo cenário

Após esta noite eleitoral, desenha-se um cenário diferente para Portugal. Deixa-nos curiosos, expectantes e até esperançosos. Só não dá para estar mais devido à infeliz subida para 3ºlugar do nosso rapaz das feiras. De qualquer modo, é algo substancialmente diferente do que temos vivido nos últimos tempos e, até ver, a coisa promete.
Entretanto, os analistas políticos já fizeram as suas coligações virtuais, os prós e contras, e não vou maçar-vos com isso.
Ontem foi uma noite histórica por muitas razões. Para além das já anunciadas, resta sublinhar uma outra muito importante: Miguel Vale de Almeida foi eleito pelo PS como independente, tornando-se, do que sei, o primeiro gay assumido a ser eleito para a Assembleia da República. Não é um gay qualquer, é um activista e, pela qualidade da sua acção política e cívica, será com certeza uma grande aquisição para a equipa dos deputados.
Sobre isso, importa também falar das imagens mais formidáveis da noite eleitoral de ontem. Sem correr quaisquer riscos de favoritismo partidário (pois não votei PS), foi maravilhoso assistir à cartologia dos apoiantes do PS depois da vitória. Viam-se as habituais bandeiras do Partido, as de campanha e depois as do Arco-Íris, símbolo do movimento gay em todo o mundo. Foi a primeira vez que as vi num contexto partidário destes, numa noite de eleição, mostrando claramente como a defesa dos direitos dos homossexuais dá os seus frutos e como a luta e a visibilidade compensam.
Para um toque ainda mais saboroso para o partido vencedor, e para mim (porque me dá esperança neste novo PS que terá de governar), havia, entre os apoiantes, muitos negros, muita cor.
Foram as imagens da noite, porque permitiram-me a mim ver um Portugal mais plural, mais rico, mais progressista e isso já soube a vitória.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

quase quase a reflectir, os vencedores são...

Acho que não sou a única a sentir que estas eleições estão mais acesas do que o habitual. Por um lado, existe o efeito Sócrates que parece despertar em muita gente uma raiva espumosa que move e desperta opiniões e convicções profundas. Depois há este clima de suspense, quem é que vai ganhar? E quem se irá coligar? Isso levanta medos e inseguranças em muita gente, surgindo novas e destemidas opiniões para sossegar outros.
Entretanto, os portugueses têm vindo a desenvolver algum espírito cívico, ainda efeito, a meu ver, do último referendo, o que tem ajudado.
Não foram tanto as ideias em causa, mas mais todo o circo à volta e o sentimento profundo anti-sócrates e ferreira leite que foram motor desta campanha.
Mantendo este nível de análise, acho que há três cartazes vencedores de campanha.



Bem feito, quentinho, cheio de esperança e garra, o último outdoor do Sócrates ultrapassa todos os outros que lançou durante a campanha. É uma peça de comunicação eficaz e motivadora como devem ser as de campanha.


O último do BE é o derradeiro passo para o poder. Finalmente atingiram a maturidade e querem mostrá-lo. Inspiram a confiança de mostrar a cara, colocando-se à frente da causa e responsabilizando-se pelo seu trabalho. Eles dizem que não vão fazer coligação, mas era capaz de nos dar muito jeito.



A pedra no charco que só alguns podem dar (antes era o BE), um desabafo universal presente no consciente de muita gente (mesmo que não seja no voto), a gargalhada anti-sistema, é assim o outdoor do MMS, que andou a campanha toda a queixar-se da comunicação social, deixando logo de ter graça.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

sem tronco nem membros

As campanhas virais estão a crescer, acompanhando a crescente adesão aos novos modos de comunicação, entretenimento e redes sociais. Hoje em dia, uma marca pode ter um sucesso estrondoso apenas pelo passa a palavra, que agora é mais conhecido por post e emails e chats. Para atingir um determinado tipo de audiência, já não precisa de spots publicitários, nem de outdoors nem de mupis nem de anúncios de imprensa. Basta simplesmente estar na internet com uma acção, filme, jogo, suficientemente diferenciadores para pôr "todo o mundo" a clicar.

Tudo isto a propósito do Quique The Head, uma campanha da Diesel que tem tudo de absurdo como de genial. E não é exagero. É a história de uma pessoa que nasceu só com cabeça e que, agora, tem a oportunidade médica de arranjar um corpo. O vídeo que fizeram retrata a vida do sujeito, o Quique, e é hilariante.
O que é desafiante nesta nova forma das marcas comunicarem é a quase total liberdade. As ideias absurdas, inteligentes, sinistras, bizarras, têm lugar, sem serem à partida barradas por limitações de formato e de critérios de comunicação para as massas. Quantas vezes um criativo já ouviu a frase "as pessoas não vão perceber", chumbando à partida determinada ideia por ser pouco convencional? É uma constante.
Parece-me igualmente desafiante porque nem todos estarão preparados. É difícil desformatarmo-nos desses códigos conhecidos e convencionados e apostarmos na explosão de ideias com efeito viral explosivo, porque o caminho está ainda muito por trilhar. Na verdade, o trabalho criativo da comunicação (e não só) passa também por conhecer esses códigos e as possibilidades "lógicas" de cada projecto a desenvolver. Esta audácia, no percurso profissional, foi muitas vezes apagada, colocando-nos muitas vezes em posição de defesa e algum conformismo.
Surgirem estes desafios e conseguirmos agarrá-los nem sempre é fácil, mas acho que esta campanha da Diesel dá-nos uma "pica" renovada para perdermos a cabeça.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

a vida, uma viagem

Acordas um dia e decides que vais para o Cairo dançar dança do ventre. Parece um pouco despropositado, invulgar e talvez a tua família e amigos se juntassem para te travar e internar-te. Para Joana Martins, ou melhor Joana Saahirah, isso aconteceu mesmo, tornando-se uma das mais cotadas bailarinas de dança do ventre do Egipto.

O que acho mais espantoso nesta história é a coragem da decisão. Seres uma mulher portuguesa e decidires mudar completamente a vida, para realizar um sonho pouco previsível num país muçulmano. Não é um caminho simples, fácil ou que outras tenham traçado antes de ti.
Li um artigo sobre ela no i de Sábado (que infelizmente não consegui encontrar online) e fiquei impressionada pelo seu percurso. Estes percursos de vida, que fazem dela uma viagem, desafiando o convencional e o expectável, simplesmente atrevendo-se a seguir uma ideia louca.
Acho que há um paradoxo no português de ser pioneiro e conformado ao mesmo tempo. Vê-se grandes investidas, desenfreadas e arriscadas, e depois muito marasmo.
No final, há uma mulher portuguesa a fazer dança de ventre como poucas. E isso compensa.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Amar as mamas

Objectivar (tanto de forma estética como sexual) as mamas para depois dizer que é preciso salvá-las é um acto arrojado, porque politicamente muito incorrecto. Mas é isso que faz esta campanha viral da associação canadiana Re-think Breast Cancer, com intenção de envolver e chamar a atenção para a questão do Cancro da Mama.
A Campanha "Save the Boobs!" integra-se no projecto Boobyball, cuja missão é inspirar novos filantrópicos para a causa, e com certeza consciencializar uma nova geração para a doença.
Dentro desse espírito, o evento preparado para 2 de Outubro é um cruzeiro em que se promete verdadeiramente festa.
Toda a abordagem à temática é disruptiva. Foge de qualquer cliché de campanhas contra o Cancro e fomenta uma atitude meio louca em relação ao assunto. Mas aí é que está o busílis: a prevenção deve ser uma festa. Qualquer que seja o cancro. Mas neste caso, tratando-se de maminhas, o elogio da festa parece mais fácil.


sexta-feira, 18 de setembro de 2009

conta a história, conta

Hoje é inaugurada a Casa das Histórias Paula Rego em Cascais.
O projecto fascina-me e estou desertinha para ir lá espreitar. Além de achar a obra da Paula Rego um palco brutal da humanidade e esteticamente pujante, a artista também me cativa. Há algo de infantil na forma como fala e um despretensiosismo que me agradam.
Hoje, na rádio, ouvi-a falar do espaço exactamente assim, como despretensioso. Essa é uma qualidade rara no mundo artístico e, na Paula Rego, encontro-a.
Por outro lado, a Casa, a que não quis chamar museu, parece ter um conceito bem catita. Aberto até às 22h, com entrada livre, com um edifício do Souto Moura, integrado no espaço, e um programa educativo amplo desenham a casa como hospitaleira. O aspecto do site, a cafetaria/restaurante e a loja prometem-nos ainda essa sensação de conforto e detalhe, que nos aconchega quando nos queremos sentir mais cosmopolitas e modernos. E, claro, há as exposições.
Para ajudar à boa sensação, esta ideia de histórias promete. Abre uma porta para mundos para explorar, para um lugar com momentos que encantam e entusiasmam, como uma boa história.
Antes de ir, já me sinto bem-vinda, talvez pelo carinho que sinto pela obra e pela criadora. E intuo a Casa como uma casa aberta a toda a gente que a quiser visitar.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Porque é bom?!

Os americanos lembram-se de tudo, e no Texas ainda deve ser melhor. Na Universidade desse estado, lembraram-se de fazer um estudo para saber por que é que as mulheres têm sexo. O estudo englobava também os homens, mas o artigo destaca mais as mulheres, talvez por um imediatismo preconceituoso de que os homens têm sexo porque tem mesmo de ser, e as mulheres é por mistérios insondáveis.
Ao ver algumas das razões destacadas, vemos uma panóplia tal de possibilidades que intuímos que o estudo não dá nenhuma resposta generalista (até porque dificilmente poderia), mas apresenta sim aos leitores um rol de motivos de terceiros para terem sexo. Não acrescenta muito, a não ser material para conversa e coscuvilhice.
A propósito dessas "grandes questões" (ou seja, mantendo o grau de superficialidade do estudo), recordo-me de uma parte da peça Caveman (de novo em cena), em que ele diz algo como "ao fim de 10 mil anos, a mulher conseguiu manter o mistério. E o homem?".
Vai daí, ponho-me a pensar nesse grande caminho de emancipação que os homens têm de percorrer. Será que ninguém quer saber por que é que eles têm sexo?

terça-feira, 15 de setembro de 2009

amar o monstro

Há anúncios que são brilhantes, anúncios que fogem ao convencional, que arriscam ao ponto de perdermos o referencial em causa (neste caso um carro) para sermos unicamente cativados pelo filme em si.
Adorei este anúncio, e mais uma vez tem a assinatura aqui dos nossos hermanos do lado. Arriba arriba!


segunda-feira, 14 de setembro de 2009

com ela, com ele

Abraços Desfeitos ("Los abrazos rotos" soa muito melhor) é mais um filme extraordinário do Almodóvar. O amor e a paixão, a trama telenovelesca, a crueza e a beleza das suas cores, dos seus diálogos (brutal o castelhano quando é de Almodóvar), tudo isso se mescla e insinua para trazer-nos mais um filme perfeito, para nos deliciar e cativar. E, claro, Penelope Cruz.


Que parceria maravilhosa encontraram eles de novo. Penelope Cruz está absolutamente brilhante, espanhola e cheia de ela própria. É difícil ter uma actriz assim e por isso é que a definição de espanhola lhe calha tão bem. Porque há qualquer coisa sem máscara em toda a máscara que a personagem tem. Ela roça a película, é assim que parece.

Este filme é mais um acto de génio, que é puro cinema. Não tem merdas, tem rodos, parece uma cesta cheia e exuberante de coisas boas.

Deixo aqui o trailler, que merece a pena, para apanharmos um pouco da crueza bela de Almodóvar com a sua Penelope.


sexta-feira, 11 de setembro de 2009

imagens cicatrizes


Foi há oito anos e, ainda assim, as imagens continuam a ter uma brutalidade inacreditável. Quem viu as imagens do embate dos aviões, das torres a cair, das pessoas a saltar, dificilmente poderá esquecer-se ou não guardar a memória das sensações sentidas.
A minha vida estava a mudar naquele momento e reforço a minha memória pessoal em relação à data 11 de Setembro de 2001.
O génio daquele atentado foi ser tão absolutamente simbólico para todo o mundo ocidental, um atentado a uma cultura. A tragédia das vítimas não teve nada de simbólico, um cenário que se repete em todo o mundo a toda a hora.
O terror perpetrado naquele momento foi um golpe de rins, insuportável e diabólico, cravando em muita gente sentimentos tão diversos como vergonha, raiva e compaixão.
E as imagens que ficaram continuam a deixar esse rasto, com um poder feroz.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

os verdadeiros latinos

Há boas notícias que são uma tal surpresa que até ficamos atónitos. E depois espantados por serem notícias de outras paragens e não daqui ou de um qualquer país nórdico, evoluído e tal. Logo a seguir, sentimo-nos envergonhados por não estarmos lá.
O Uruguai aprovou a adopção por casais homossexuais, tornando-se o primeiro país da América Latina a fazê-lo. Para mim, até agora, o Uruguai era apenas mais um daqueles países da América do Sul, com uma bandeira parecida com a da Argentina. Agora é um país pioneiro. E imagino como será de facto. Para ir contra a Igreja Católica e uns quantos psicólogos de determinada linha, não pode ser só mais um país. Precisou de uma classe política suficientemente esclarecida, progressista e corajosa para ter a ideia e depois fazê-la andar.
É uma boa notícia para o país, para o continente americano, para os latinos e, no fundo, para todos nós. Pelos 30 segundos de notícia, até nos faz bem a nós, revigorados e esperançados.


quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Sobre bola e o resto

Hoje é o tal dia em que está tudo em jogo na qualificação para o Mundial de 2010. Já se fala disto há uns dias, semanas, meses e não é grande assunto para desenvolver. Ou ganhamos hoje e talvez haja ainda uma esperança e tal se os outros falharem, ou perdemos e então escusamos de preocupar-nos mais com isso, fica para a próxima.
Pelo caminho desta demanda infeliz da nossa selecção pós-Euro 2004, muita coisa aconteceu. Dissemos adeus ao Scolari, e depois daquela tentativa de murro ninguém se importou, dissemos "lá vem este" ao Queirós e, num instante, passou toda a febre das bandeiras à janela para uma indiferença envergonhada pós-indignada. A culpa é do Queirós e de outros que agora não interessa, ou talvez do Scolari e do Ronaldo e de mais outros que ninguém quer saber.
Pelo meio também, insurgiram-se vozes contra o advento de Liedson que, será que ninguém reparou?, apenas revelaram a muita xenofobia que para aí anda. A meu ver, uma selecção é a representação de um país. E o nosso país, felizmente, é multi-étnico, diverso e faz-se das pessoas que o compõem. Ser português é fazer por Portugal e escolher fazê-lo, pelo que imagino que haja muitos "estrangeiros" por aí, com a nacionalidade "pura" marcada no B.I., mas que de portugueses têm pouco. Daí só a haver uma resposta: o Liedson escolheu ser português, logo deve jogar na nossa selecção. E depois de marcar um golito, a xenofobia decresceu drasticamente. Se querem jogadores portugueses "puros" (seja lá o que isso for, afinal até o Ronaldo nasceu na Madeira), invistam na formação e sejam como o Sporting.
Adiante que esta conversa está a tornar-se demasiado tecnicista (outra palavra estranha da gíria futebolística).
A febre da selecção baixou drasticamente e só voltará eventualmente com um apuramento. Entretanto temos os clubes e os benfiquistas estão garantidos com a sua euforia, os portistas têm os títulos e os sportinguistas (como eu) têm o esforço, a dedicação, a devoção e o desânimo (em substituição da glória). A selecção já nem sequer tem um bigode, porque o nosso seleccionador snob cortou o dele há anos. Assim não vamos lá!
Alguma alegria dei eu aos vitorianos (Setúbal) quando, em terras estrangeiras para eles (Lisboa), apitei fervorosamente quando os ultrapassei na estrada. É preciso ver que eles levaram uma catrefada de golos dos eufóricos do Jesus. Solidariedade precisa-se e, além disso, o equipamento é verde.
Entretanto este post tornou-se algo bizarro, sendo a conclusão possível a seguinte: o futebol não está sexy (como se diz na gíria da comunicação), está antes chato e pouco épico como a gente gosta, está matemático e à rasquinha. A malta só aguenta isto por causa da cerveja.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

boa casta

A Casa Ermelinda de Freitas* pode regozijar: o primeiro mosto a sair das vindimas de Palmela tem 14,7º de teor alcoólico.
Esta frase talvez não faça sentido nenhum, mas saca a rolha da conversa que me interessa. Ontem, passei pelas Festas das Vindimas, em Palmela, e assisti à "saída" do primeiro mosto. Deu direito a benção e tudo dos padres da paróquia.
No momento em que o sumo da uva vai deixar de sê-lo, iniciando assim o processo de fermentação para o vinho, dá-se este acto simbólico de benção, com a reunião da população em torno de um produto tão profícuo para o nosso povo, tanto em termos económicos como sócio-culturais. Uma festa que recria uma tradição popular, ampliando a sua dimensão e enfatizando ainda mais o simbolismo do momento.
Na verdade, não percebo muito do assunto. Apanhei tudo meio de esguelha, mas consegui perceber este essencial (14,7º de teor alcoólico) e ainda comi umas uvas doces e saborosas.

Mas foi o simbolismo do acto que mais me impressionou, esse desejo de um bom ano de vinho, como se antevendo e prolongando a esperança de muitos bons momentos a apreciar um copo de vinho em boa companhia. Este foi o cenário de benção que imaginei, neste olhar de relance que tive, em que todos os olhares, desejos e energias entraram em comunhão naquele momento para criar um bom vinho.

* A menção à Casa Ermelinda de Freitas é pessoal. É uma das minhas Casas preferidas pelos vinhos que já tive o prazer de beber, pelo seu Syrah 2005 (melhor vinho tinto do mundo) e pela tradição de mulheres proprietárias. Mas, no fundo, o vinho das Terras de Sado tem estado cada vez melhor e tem sido um verdadeiro prazer descobri-lo.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

menina, estás à janela

Ontem à noite, passei por uma serenata. Assim mesmo, ia de carro e no meio da rua estava uma tuna a cantar e a tocar uma canção de amor. À janela, estava a moça, com ar inebriado, satisfeito e, claro, meio embaraçada.
Nunca tinha assistido a nenhuma e achei realmente encantador, devo confessar. Tenho alguma aversão a tunas e à tradição académica, mas adoro expressões públicas e exageradas de amor. E, talvez por isso, não me tenha incomodado nada ver a tuna (como normalmente costuma acontecer), pelo contrário gostei de os ver e ouvir.
Isto de expressões públicas e exageradas de amor tem uma carga social muito ambígua. Há um constrangimento social que impele para o embaraço e contenção dessas expressões, mas há, parece-me, um comprazimento e desejo, por vezes inconfessados, de as vivenciar, de as receber e de as realizar.
Esta ambiguidade garantiu o talento e sucesso da campanha do Cornetto da Olá, desmascarando um pouco a sobranceria e altivez hipócritas dos cínicos do amor. O ser ridículo faz parte do amor. E não é preciso nenhum esforço.


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Frescura


Um dos prazeres de trabalhar em Santos é poder ir, à hora de almoço, ao Mercado da Ribeira. A maior parte das bancas já estão fechadas mas, ainda assim, consigo encontrar duas ou três de frutas e legumes e é um verdadeiro prazer.

Os frutos e legumes dos mercados são belos, cheirosos e desformatados. Estão a anos-luz dos frescos dos super e hipermercados, não só em termos de sabor, origem e contexto, mas principalmente por uma questão de alma. Os alhos, pêssegos, pimentos, courgettes e tomates que comprei hoje vieram de algum sítio com terra. Não cresceram numa embalagem com celofane nem apareceram directamente nas prateleiras. Têm sabor porque têm história.
O Mercado da Ribeira tem uma dimensão e um ambiente (principalmente no auge do seu funcionamento, quando está cheio e com todas as bancas a funcionar) que enriquecem ainda mais essa história. Assim vazio, a imponência é menor, mas provoca igualmente a sensação de privilégio e de espaço público, comunitário e alfacinha.
A dimensão de qualquer mercado é universal e intemporal. Comprar num mercado dá um prazer que nos aproxima mais da humanidade, é um acto quente e pessoal, em vez de frio e indiferenciado.
E o prazer da frescura dos alimentos é insubstituível. Na cidade, no campo, no grande Mercado da Ribeira em Lisboa, ou no pequeno mercado de Vila do Bispo, ficamos com produtos melhores quando voltamos para casa.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

hit by bus? faz um festival para celebrá-lo

Ao voltar à cidade, deparei-me com um cartaz a anunciar o BFF - Bicycle Film Festival. Fiquei confusa e reflecti sobre o que poderia ser um festival de cinema de bicicletas. Uma espécie de drive-in com biclas? Só filmes em que apareçam bicicletas? Filmes de provas de BTT?
Normalmente só me deixo ficar pelas divagações quando o resultado é interessante. E desta vez os devaneios não eram suficientemente desafiantes. Por isso, fui investigar. Fiquei a saber que o BFF já existe desde 2001, ano em que o seu fundador e mentor foi atropelado, em Nova Iorque, enquanto passeava de bicicleta. Em vez de ficar traumatizado, decidiu criar um festival para celebrar todas as expressões artísticas e performáticas que envolvam bicicletas.
O festival acontece em várias cidades e agora chegou a vez de Lisboa. O programa pode ser consultado aqui.
Mesmo com as explicações não sei bem o que esperar. Mas de qualquer modo fiquei intrigada e com vontade de espreitar. E, quem sabe, pedalar.


terça-feira, 1 de setembro de 2009

à volta

Estar em Lisboa, já fora de férias, não significa estar de volta.
Estar de volta, desta vez, vai demorar. E não me importa muito que a adaptação chegue tarde. Estou ainda como o lugar que deixei, rude e selvagem. Mas sem a beleza e a liberdade que por lá deixei.
Há lugares que nos envolvem. Porque são cheiro e som diferentes, porque tudo à volta pousa nos olhos sem entrar por eles adentro. Porque o tempo se torna diferente, sem caprichos nem pressões. Voltei meio africana, sem sair deste país, meio selvagem mas imersa em comunidade. Fiquei assim sem me dar conta. E agora não me rala a sobranceria nem a altivez de Lisboa. Não me rala a sua beleza e a sua atracção. Sei que vão chegar e então estarei de volta. Mas, por enquanto, não lamento não estar cá.
Lamento não estar lá. Mergulhar em águas sereias. Levar com a brisa a cheirar a esteva. Ter o corpo coberto de sal e sol. Ser elevada por paisagens agrestes. Guardar restos de comida para os animais. Andar despida. Entrar no lugar e permanecer na paisagem. Tornar-me parte dela, ser o lugar simplesmente.
É um privilégio viver assim por 15 dias. Sem perfeição nem ilusão. Com muito menos camadas. Partir é abdicar desse privilégio. É voltar a outros privilégios que, por alguns momentos, ficarão sem sabor.
A terra é tão saborosa e gostosa, que é impossível que tudo o resto, mesmo sofisticado e galante, não pareça sensaborão por uns tempos.

Para entreter-vos deixo aqui a 2ªparte de um documentário sobre a Mayra Andrade. É curtinho (10 minutos esta parte) e vale a pena. Podem ver a 1ª parte aqui. Esta foi a banda sonora dos 15 dias. E nunca cansou. Ainda não consegui deixar de ouvir. Tem a mesma rudeza e beleza que encontrei. Tem a mesma cadência e é um encontro semelhante de gentes e ritmos.