sexta-feira, 30 de abril de 2010

o nosso tempo

Sempre adorei música de outros tempos, especialmente a dos anos 80 cativa-me. Não deixei, por isso, de ouvir música actual, nem decidi fazer uma permanente.
Nos últimos tempos, tenho-me aborrecido um pouco com este revivalismo exacerbado. Já passámos pelos hippies, pelos punks, mas agora esta febre dos 80 está a cansar-me um pouco devo confessar. Os penteados e as roupas estão a ficar demais. Vai-se à zara ou à h&m e há tigrezas, zebras, folhos e chumaços por todo o lado.
Não dá! Ontem, depois de ver isto, disse BASTA!
Cansada do psicadélico barroco, assumi os anúncios do Citroën DS3 como meus. Adoro o conceito Anti-retro e aderi a esta "causa". Eles conseguiram com esta campanha fazer uma coisa excelente: pegaram num sentimento que deve ser comum (este cansaço das décadas passadas) verbalizando-o nos ícones dessas mesmas décadas. Acho muito engraçado por isso. Mas gosto fundamentalmente desta formalização tão fechadinha: anti-retro.
Gosto do antigo, não me percebam mal. Gosto da história e da cultura pop, adoro ABBA e Bee Gees, mas já não aguento ver o mau gosto ressurgir como se fosse uma coisa com pinta.


uma noite destas

Vão até ao GTIST descobrir o novo espectáculo "Intervalo para dançar". E, entretanto, vejam o teaser.


a arrogância prepotente

Há uns tempos atrás, falei aqui da acção das holandesas numas eleições recentes, em que colocaram lenços na cabeça em solidariedade com as mulheres muçulmanas e contra o partido de extrema-direita. A subtileza do gesto individual não diminui em nada o impacto e a dimensão do acto colectivo, tornando-se mesmo um verdadeiro símbolo daquilo que é uma sociedade múltipla, capaz de se construir inter-culturas.
Hoje, o dia é diferente. A Bélgica aprovou a proibição do uso de burqa ou o niqab no espaço público, revelando um profundo desprezo pela liberdade, atentando contra valores tão altos como os que a burqa atenta.
Eu não sei o que esperam os senhores legisladores. Que, por obra e graça da sua lei, essas mulheres e seus respectivos maridos e famílias, passem a abraçar os hábitos ocidentais ou que, simplesmente, deixem de incomodar os restantes transeuntes lembrando-lhes de uma realidade demasiado próxima?
Estas mulheres, com burqa ou sem ela, vivem na sociedade belga, fazem parte dela - há que saber lidar com isso, não esperando que a resposta mais fácil seja a melhor para a sociedade.
Há quem diga "Em Roma, sê romano", argumentando assim que as mulheres de burqa não têm lugar nesta "Roma" que o ocidente criou. Discordo. Na minha "Roma", há lugar para a diferença, para crescermos juntos com as nossas diferenças. A cultura ocidental está longe de ser perfeita, desenganemo-nos, está longe dos valores humanistas que hipocritamente defende. A Bélgica hoje não é definitivamente a minha Roma. Lutarei por essa e pelos direitos da mulher de burqa, cuja ambição não tem de ser necessariamente a mini-saia.
A liberdade não tem um conteúdo consensual. Mas, na essência, é o contrário do que esta lei impõe. Conseguiremos viver com a ambiguidade e, assim, preservar a liberdade ou estaremos prontos a abdicar dela em nome do nosso conceito de homogeneidade?

quarta-feira, 21 de abril de 2010

objecto vs. sujeito

Muito se falou da campanha da SuperBock Mini Stout. O "É só puxar", associado a um corpo acéfalo de mulher meio nu, caiu mal a muita gente. Achei a campanha gráfica bem fraquinha, básica, sem graça e obviamente infeliz. Não por pudor, ver maminhas roliças não tem nada de mal, mas sim pela objectificação desnecessária. A campanha de TV falava de prazer e tinha um SPA ideal para apreciadores de Stout. Também tinha as "gajas boas", mas elas não eram o centro. O problema foi desviar o objecto do prazer, na campanha de mupis. Em vez do prazer da cerveja, veio outro prazer. Num entanto, esse prazer sexual continuava a ser exclusivo do apreciador de cerveja - "O prazer é todo seu". O "É só puxar" dava-lhe esse lado de dispor como se quer e apetece, e nem por sombras alguém pensava em puxar a tampa da cerveja.


Em anos e anos de campanhas de Marcas de cerveja, o que houve mais foi objectificação da mulher. A Sagres sempre foi exímia na introdução da gaja boa como motor de vendas. Chegou inclusive a comparar as cores da cerveja com a cor de cabelo e de pele das actrizes brasileiras.
É algo a que estamos habituadas/os. Não acrescenta, não valoriza, mas o pessoal da publicidade (das próprias empresas) deve achar que é isso que atrai o consumidor da cerveja.
A meu ver, é porque não valorizam suficientemente o produto. Há grandes anúncios de cerveja. Basta ver os da Heineken, por exemplo. E depois há os outros.
Tudo isto a propósito de um pack desenvolvido por uma Marca holandesa de cerveja, a Bavaria, destinada a mulheres. Este passo "desviante", inédito em Portugal, assemelha-se, por exemplo, à crescente aproximação dos clubes de futebol às mulheres adeptas, numa renovação do estereótipo habitual. Se falo sobre futebol, não é por acaso, porque o que a Bavaria fez foi colocar no pack um vestido/camisola, desenhado por uma estilista holandesa, para apoiar a selecção laranja no Mundial. O que é que os senhores das cervejas pensaram? É óbvio que não precisamos vender cervejas aos homens durante o Mundial (eles fá-lo-ão "naturalmente"), mas e se as puxarmos a elas? Parece-me um óptimo mote. Sem sair das ideias feitas de moda e de "feminilidade", conseguiram ampliar o conceito, conferindo-lhe dois valores habitualmente associados aos homens: cerveja e futebol.


Não fazia mal aos nossos Senhores da Cerveja olharem para estas coisas e perceberem que há um grande potencial de consumidoras a conquistar.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

o utilizador feminino

Hoje passei por uma "Bluestore", que é como quem diz uma loja tmn cheia de tralhas, entre as quais telemóveis, acesso à internet, pacotes de tv, eu sei lá. No meio da panóplia e já quando estava a pagar, descobri algo interessante, deveras interessante. Um stand-up de balcão a publicitar um telemóvel (cujo modelo se chama Diva e a marca começa por S, acaba em G e tem AMSUN no meio - só para despistar). Um dos pontos de venda era, nada mais nada menos, que "Interface de utilizador feminino". Fiquei espantada, intrigada. Nem sequer era um "ideal para mulheres" ou "o modelo mais feminino de todos os tempos", nada disso. É um novo conceito totalmente disruptivo: o utilizador feminino.
Note-se uma vez mais em português: não é a utilizadora - é o utilizador feminino.
Bom... fui tentar perceber o que era isso do utilizador feminino. Estou interessada nestas matérias. Fui ao site da tmn, fui ao site da marca e fiquei com algumas pistas.
Li as "Características diferenciadoras" do telemóvel e passo a citar as que eu acho que se referem aos atributos do utilizador feminino.
Cá está:
. Beauty Effect é uma funcionalidade que permite "fotos com uma luminosidade própria de uma revista de moda";
. depois há o Lomo Shot, que torna as "cores mais vivas e brilhantes", e que ainda permite trabalhar as fotografias "de uma forma artística e original";
. a Wish list, uma Lista de Compras com organização e categorização de compras de "forma apelativa";
. esta é das minhas preferidas, a Fake Call, para receber chamadas falsas quando o utilizador feminino "está numa situação embaraçosa/aborrecida";
. e outras coisas relativas à Internet e às redes sociais.
O que descobrimos nesta viagem?
O utilizador feminino consome obviamente moda, adora cor, quer ter fotos luminosas e tem beauty a sair-lhe pelos poros; é fanático por compras é claro; tem propensão a situações sociais incómodas, talvez por causa do problema dos poros e, claro está, evita o conflito, prefere arranjar uma desculpa.
Se tivesse de pensar muito iria descobrir um ou dois utilizadores femininos nos meus conhecimentos. Mas com este requinte, garanto que seria difícil. Isto é uma versão optimizada da dondoca. E, claro está, o interface de utilizador feminino não tem características diferenciadoras do género "conciliar reuniões com horas de mamadas" ou passatempos para identificar estereótipos do feminino. Mas talvez fosse boa ideia. É que o utilizador feminino não é uma mulher, é uma diva, como o próprio nome indica.
Já para não falar de todos os homens (já não dá para escrever utillizadora masculina - que espanto) que se interessam por moda, cores garridas, compras e fugir com uma péssima desculpa. Esses homens não são destinatários deste produto.
Agora a sério: eu sei que há produtos feitos para mulheres. Pensos e tampões, gogirl, roupa, carros, etc... eu sei disso tudo. Mas há que saber distinguir o que é diferenciador ou exclusivo nos produtos e vendê-los como tal. O verdadeiro utilizador feminino (ou seja, gaja com telemóvel) pode usar qualquer tipo de telemóvel. E há utilizadores, em geral, que prefeririam este modelo - mas isso não faz deles mais femininos. Nada contra a escolha.
Tudo contra a mensagem e o preconceito inerente.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Um livro bolha-cósmico


Lucía Etxebarría é uma autora com visão do mundo. Uma visão que me agrada. Desde a desconfiança inicial que senti com um dos seus primeiros livros Amor, Curiosidade, Prozac e Dúvidas - os best-sellers têm esse efeito em mim - rapidamente me cativou assim que me dispus a abrir um livro dela e lê-lo. As suas reflexões sobre as mulheres, o seu feminismo moderno, descomplicado e directo, a sua ausência de preconceitos face à cultura "pop", da qual no fundo faz parte, o seu humor, foram algumas das qualidades que me conquistaram nesta espanhola com nome difícil de dizer.
Há uns sete/oito anos cruzei-me com ela numa fnac. Havia uma daquelas sessões de autógrafos e apresentação de livro (já não me lembro qual), mas devido a um erro no horário na agenda, não apareceu ninguém. Ela lá estava, rodeada com a agente e algumas pessoas da fnac, sentada numa das cadeiras do público a fazer colares de missangas. Na altura, fascinou-me a figura dela, o ar meio desalentado que tinha mas igualmente resignado e disposta a passar por aquilo fazendo mais um colar. Era cómico e doce, lá está. Assinou-me uns livros, trocámos umas palavras e falámos sobre o Caetano Veloso, concerto a que eu assistira na véspera e que ela gostaria de poder ver no concerto do mesmo dia. Enquanto falava comigo mantinha as missangas na mão. De algum modo, aquilo que ali aconteceu tinha tudo a ver com ela. Uma espécie de poesia do dia-a-dia sem grande charme, sem grande cosmética, muito real.
Diz-se realista. Há pouco, encontrei uma entrevista dela porque estava intrigada com este Cosmofobia, que me pareceu demasiado real, mas que depois me esclareceu sobre os seus fundamentos. Na entrevista, Etxebarría fala do seu realismo, daquilo que quer para o seu país, da sua filha e, agora, da sua incursão pela literatura infantil - acho que é uma tentação irresistível para os escritores que têm crianças na sua vida. E às tantas diz "Me gusta muchísimo bailar, creo que es lo que más me gusta en el mundo junto con escribir y hacer el amor." - e eu adoro estas coisas, porque unem a liberdade, a verdade e a alegria. Gosto deste seu realismo real em vez de negro ou simplesmente prosaico.
Etxebarría também é poeta, embora só conheça a sua poesia em castelhano, já que não há nenhuma poesia dela publicada em Portugal. Lembro-me que, até há pouco tempo, os seus livros vinham com uma manga com umas declarações dela numa entrevista em que dizia algo como "sou um ser absolutamente sexual". Acho que foi sempre nesse prisma que a tentaram vender por cá. Aborda a sexualidade de forma directa e fá-lo bem. Mas há muito mais que isso.
Bom, e agora o livro, não?
Não foi o livro que mais gostei dela, mas não deixa de ser cativante. A autora discorre sobre as histórias do seu bairro madrileno, Lavapiés, um "melting pot", em que só existe multiculturalidade e pouca interculturalidade. Com histórias cruzadas, que muitas vezes confundem o leitor, a obra no final marca esse ponto - o de mantas de retalhos em que poucas vezes as ligações são reconhecidas, pelos próprios actores da narrativa. Estamos todos ligados e todos ausentes e auto-excluídos dessa ligação.
O livro tem momentos muito fortes e leva-nos para a torrente das emoções humanas, para as dificuldades de viver e de nos relacionarmos. Como ela diz, na entrevista citada, são personagens que não encontram o seu lugar no mundo, que não se integram. À brutalidade de certas situações junta a magia do invisível noutras.
É isso que gosto nela, essa visão tão clara sobre o mundo, mas tão pouco dogmática e tão aberta a ele.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Dia de vitórias

Hoje passei o dia a dormir.
E, quando acordei, as notícias eram as melhores: O Tribunal Constitucional deu luz verde ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e foi aprovada a lei que acaba com a absurda discriminação de os gays não poderem dar sangue.
São duas vitórias num só dia.
Vitórias que fazem deste país mais livre.
É bom acordar com notícias assim.

COISAS QUE ME ENTRAM PELOS OLHOS ADENTRO