quarta-feira, 4 de junho de 2008

Gostam? mas gostam mesmo?

Há campanhas publicitárias que não se entende como é que foram criadas, aprovadas, finalmente produzidas e postas cá fora... umas porque são más, outras porque não se percebem ou são mesmo estúpidas. A campanha desenvolvida para novos hospitais de uma rede privada reúne tudo isso: está mal feita, não se percebe, é estúpida e socialmente irresponsável.






Mal feita

Que raio de imagem é aquela? A mulher parece que está a morrer ou que saiu de uma comunidade hippie dos anos 60, com uma dose extra de alucinogénios. "Nós gostamos de si"? Que é que isso me interessa? Se for ao hospital, quero que tratem de mim, da minha saúdinha. Não têm nada de gostar ou não gostar de mim.


Não se percebe

Pois claro que não se percebe. Quem é aquela pessoa a segurar naquela flor? São os doentinhos? É a enfermeira? É nossa senhora? E gostam de mim e então?


É estúpida

Ah pois é! Estão a gozar connosco? Que valores é suposto transmitirem com aquilo? Eu continuo a achar que flores e hippies não têm nada a ver com saúde... Gostam de mim e nem me conhecem de parte nenhuma.


Irresponsável

Esta coisa de dizerem "Nós gostamos de si" parece ser por oposição a "uns outros tantos que não gostam de mim". Pagando gostam de mim, não pagando, depende. Com aquela cabeleira, ar de agarrada e de florzinha na mão é provável que no Sistema Nacional de Saúde não gostem dela. Nem no SNS nem em lado nenhum. 


Em conclusão

Claramente a mulher é suicida e a mensagem da campanha é "mesmo que se queiram matar, desde que paguem, está tudo bem". Nós gostamos de si e não é por pagar, é porque gostamos de toda a gente, até de sujeitas estranhas, com ar de figura mitológica em fim de carreira. 

O que é que esta gente anda a pensar?

sexta-feira, 16 de maio de 2008

pela boca fora

A linguagem é determinante para a percepção de um determinado objecto. O poder que possui pode num certo sentido alterar o próprio objecto. 

Quando usamos determinada palavra para definir determinado objecto estamos a alterá-lo. Até numa coisa tão simples como uma cor. Dizer negro como breu não é o mesmo que dizer preto. Porque a linguagem é o reflexo de um olhar e possibilita a criação de um outro, quando é partilhada. 

1. Em comunicação, o trabalho é esse mesmo: alterar a percepção de acordo com os "nossos" objectivos. Muitas vezes, na nossa actividade, podemos pervertê-los subtilmente, ou arranjar forma de alterá-los sem os "danificar", de acordo com o que é a nossa visão do mundo. Às vezes podemos fazê-lo com intenção, outras de forma inconsciente. Por isso mesmo é que a maior parte da publicidade não faz mais do reforçar estereótipos, porque são eles que dominam o inconsciente colectivo.

Esse é um poder que devemos ter consciência que utilizamos. Acho salutar que aquele que desenvolve esse tipo de linguagem em comunicação tenha noção da sua perspectiva e saiba usá-la para o "bem". Isto é, que subverta aquilo que tem a subverter, veiculando uma mensagem progressista (no meu caso) para a sociedade e que consiga ao mesmo tempo ser um bom profissional. No limite, que venda sabões mas que apresente uma boa razão para isso.


2. Ainda sobre a questão do poder da linguagem para definir um objecto, veja-se isto. Um dos candidatos àquele partido português laranja diz sobre o casamento entre homossexuais que "Não é importante a designação que damos ao instituto desde que possamos garantir esses direitos”, defendendo assim "alguma forma de contrato civil semelhante ao casamento", desde que não se chame isso. Faz lembrar a rábula dos Gato Fedorento sobre o Marcelo e o aborto. União  civil badalhoca e secreta entre duas pessoas do mesmo sexo, SIM, casamento com cerimómia e festa NÃO! 

O que eles sabem é que não se pode mexer no nome. Porque dar um nome de heterossexuais é normalizar a dita união, alterando o objecto em causa. Neste caso, o objecto casamento e também o objecto homossexualidade. Os mesmos direitos legais não fazem o mesmo objecto, logo não dão os mesmos direitos. É o nome que confere os direitos e privilegia a valorização do dito contrato. Se não, é apenas mais um estigma. 

E estes senhores do poder com certeza sabem disso e pensam que conseguem agradar a gregos e troianos. Mas há troianos que querem o nome.   
 

quinta-feira, 8 de maio de 2008

n'est pas pour tout le monde

A andar pela França, descobri uma loja absolutamente extravagante. 

Dedicada à venda dos famosos macarrons - não macarrão, mas uma espécie de suspiro e chocolate em forma de mini-hambúrguer - La Maison Bouillet é um verdadeiro regalo para os olhos. As cores destes pequenos alimentos são estonteantes e, nesse sentido, acabam por ser mais objecto de admiração visual do que propriamente gustativa. 




Para aguçar ainda mais o visitante, só existem lojas em Lyon e em Tóquio. Com tal exclusividade, o visitante sente-se desarmado pela experiência e impelido a comprar pela oportunidade. Não sentiria o mesmo, parece-me, se só existissem lojas em Lyon (o que as tornaria mais exclusivas, mas com mais carácter de souvenir). A loja de Tóquio eleva a marca para um patamar de refinamento e raridade que as três em Lyon nunca alcançariam sozinhas. 

É certo que só descobri que a loja também existia em Tóquio depois das compras, ao ver a morada no saco. Mas isso não minimiza o impacto, antes valoriza a beleza dos objectos dispostos. 

sábado, 26 de abril de 2008

o cliente que atrai novos clientes

É uma técnica comum em publicidade usar uma figura pública, com relativa notoriedade (afinal depende sempre do produto em causa), para promover um determinado produto/serviço/marca. Às vezes, pode sair furado ou causar mesmo algum embaraço, como por exemplo uma determinada seguradora usar um determinado apresentador de televisão que de repente se torna um dos mais mediáticos suspeitos de um processo escandaloso no país. Eu, pessoalmente, acho também embaraçoso colocar a Catarina Furtado a dançar à volta de umas cadeiras para promover um Banco, mas isso sou eu, que não nutro grande simpatia pela senhora.



Agora, há casos que só podem causar estupefacção. Como por exemplo este anúncio estranho de uma aparentemente conceituada marca de relógios que coloca o Napoleão Bonaparte como seu cliente desde 1798. Por mim, tudo bem, demonstra antiguidade, rigor e com certeza precisão. Afinal o homem andava para aí a conquistar a Europa toda, era bom que o seu relógio estivesse bem certo. Se calhar na batalha de Waterloo, esqueceu-se de dar corda ao relógio e foi o que se viu.




Colocar um senhor Imperador a vender um relógio parece-me um pouco demais, ainda mais quando o homem tinha uma psicose megalómana do piorio. Resultará? pergunto-me eu. Trata-se de uma campanha internacional, como pude verificar no site oficial da dita marca, por isso é coisa para nutrir algum efeito. Será que, ao ver tal anúncio, um homem de negócios sente que está imbuído de alguma especial luz se usar o dito relógio? Será que sente que pertencerá a uma elite especial, feita de sucesso e conquista, se comprar o modelo que o Napoleão usa desde 1798? O impulso é "ai, ai, vou já comprar o relógio do napoleão!"?



Há ainda outras questões curiosas, do género: será que a dita postura do Imperador com o braço era só para mostrar melhor a marca do seu relógio? será que o conquistador da Europa dos inícios do séc.XIX ainda é cliente? e por que é que ele está tão giro no anúncio? Considerações que a campanha deixa escapar, levantando um incontornável debate.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

a maçã com uma trinca

Lá vêm os especialistas outra vez. Desta feita resolveram fazer um inquérito para agarrados das marcas, que culminou naquilo que eles chamam de Brandjunkies Awards. Por mim, tudo bem. Medir o impacto de uma marca na vida das pessoas, da sociedade e da cultura, parece-me um exercício interessante. Eventualmente podemos achar que roça o fútil, mas uma marca como a McDonald's, por exemplo, diz muito sobre a sociedade em que vivemos. 
Aparte isso, a futilidade está, claramente, nos "junkies" que responderam ao inquérito. A Apple aparece no topo de quase todas as respostas, excepto nas perguntas "más", e isso indica apenas uma coisa: os junkies são os tipos dos gadgets, que é como quem diz gostam das coisinhas que a Apple faz. Dos iMacs, dos iPods, dos iPhones, iPoraífora. 
Uma marca como a Apple, fortíssima e impactante obviamente, é ainda assim uma marca para um nicho. O mesmo nicho que provavelmente se interessa por marcas. Se sociólogos tivessem respondido a este inquérito, teria a Apple estes resultados? Não se trata aqui de uma idiotice minha de estar a torcer por outra marca - na verdade pouco me interessa. Trata-se mais de tentar perceber como o contacto de cada um com as marcas é facilmente relativizável ou enquadrável num determinado grupo de gente.  

terça-feira, 1 de abril de 2008

mulher africana

Ainda não tive a revista na minha mão, mas à partida adoro o conceito. "A nova revista para a mulher africana" parece-me um nicho muito improvável, mas isso atrai-me sobremaneira. É um target muito específico, que ganha aqui uma visibilidade rara. Espero, quando vir os conteúdos, não me desiludir. Até lá, estou realmente impressionada.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Baixa num minuto vs. Baixa em 30 mins

Num minuto...
A caminho de um almoço, passei pela Baixa de Lisboa de carro. Pela Rua da Prata, cruzo-me com umas pouco visíveis faixas num primeiro andar que dizem "Dê uma volta pela Baixa". Não percebo quem é a entidade que assina a mensagem, mas percebo-a. Mas duas faixas ali localizadas quererão dizer o quê? Fico intrigada, mas continuo. Quando viro para o Rossio, depois da Praça da Figueira, topo um Sr. Polícia já com os seus 50 anos com um guia da cidade na mão. Nunca tal tinha visto. Um agente da PSP preparado para responder às dúvidas dos transeuntes sobre trajectos, localizações, museus e castelos? Facto inédito e louvável, mais uma vez sem saber se se trata de iniciativa individual ou pública, mas ainda assim digno de nota. Passo pelo teatro Nacional D.Maria e lembro-me do cenário anterior à actual esplanada, sem-abrigos, emigrantes, para constatar que à porta da livraria do teatro, dorme um sem-abrigo, no meio da gente a passar. A Estação do Rossio, revigorada, sorri para mim e pede-me uma visita. 

Em 30...
De regresso, apanho fila logo na Avenida. Vejo novos polícias nos Restauradores. Há Manif, é óbvio. Passados longos minutos, chego ao Rossio e vejo a dita... umas 200 pessoas ocupam a Praça. Parece anti-precariedade, mas sob égide CGTP. As palavras de ordem atraem-me, são a base de toda a "propaganda" publicitária - mas muito mais eficazes e prementes. O regresso é feito pela Rua do Ouro e a fila está longe de acabar. Há obras na via. Finalmente o Terreiro do Paço, de novo aberto ao rio. E vejo outra faixa, agora a anunciar a Grande Manifestação de 28 de Março, de Jovens Trabalhadores. Percebo a escassez do número de manifestantes. São jovens, são precários, estão a trabalhar e nem sabem.



Ver uma cidade é muito mais que olhá-la. A Baixa, na sua infinidade de contrastes (muito mais do que enumerei aqui), é uma bela lente para senti-la. Tenta ser moderna, cosmopolita, limpa, mas está cheia de tantas outras coisas muito menos alinhadas que a traça pombalina, que a meu ver tornam esta cidade muito mais atraente. Talvez porque se torna mais urgente, tal como as palavras de ordem.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Discutir o indiscutível?

Os especialistas da comunicação decidiram pôr à discussão se a marca do "Comunismo" está apta para o futuro ou não. É claro que os especialistas deste canal são nova-iorquinos, mas ainda assim americanos e portanto a discussão fica logo um pouco limitada àquela visão tendenciosa que eles têm sobre o comunismo. 
Aliás, levantarem até a discussão nuns tais termos revela um total despreendimento em relação à ideologia. Algo afastado, localizável e enquadrável dentro dos chamados estados comunistas. Balizam a coisa entre Che Guevara e a China. E daí por adiante não se pode esperar uma discussão especialmente profícua. 

É óbvio que há valores de marca que podemos reconhecer no comunismo. Há ícones que se repetiram ao longo dos tempos, exactamente como pulsar de sobrevivência da própria "revolução". Lenine, Estaline, Che, Fidel, Mao, todos eles foram elevados a um espectro que ultrapassa qualquer marca. Mas a partir de um determinado momento, passaram de ícones de regime para ícones usáveis. As tshirts do Che, os lenços palestinianos, e por aí fora, tornaram-se ícones visuais, que pouco a pouco têm vindo a perder o seu referente fundamental. 
Ainda assim, toda a iconografia relacionada com e criada em regimes ditos comunistas foi "publicitária" de uma ideia. Foi concebida para isso mesmo, para vir para a rua e para sustentar e retratar o "comunist way of life" (estranha formulação esta). 

O comunismo, enquanto ideologia, está longe de estar morto. E a "marca" Comunismo, como eles o colocam no brandchannel, vai tornar-se cada vez mais marca, perdendo, como já disse, o seu contacto com a ideia. Basta ver como os miúdos andam agora com os lenços à Arafat, sem fazerem a mínima ideia do que estão a usar. O usável em cada tendência tem a ver com essa capacidade de banalizar o valor do que está em casa - ainda há uns dois anos, a tendência era usar placas identificadoras (usadas pelos soldados) ao pescoço. Quem as usava não era pró-guerra e duvido que as ostentasse por qualquer valor político. 

A nível institucional, penso que a tendência será limpar essa iconografia, como os tais murais do PCP em Alcântara ou reformular a bandeira, como no caso de Angola. A título de exemplo, aqui fica a actual bandeira deste país com a proposta para uma eventual mudança. 





quinta-feira, 20 de março de 2008

Pub vs Real



Uma imagem sobre outra imagem altera profundamente o sentido de uma e da outra. Em 1937, vítimas das cheias de Louisville (E.U.A.) - seriam todas negras? - aguardam numa fila para obter comida e roupa da Cruz Vermelha. Atrás têm o sonho branco do seu país. Tudo de repente se torna mais impressionante e surreal. A frase "There's no way like the american way" torna-se bizarra e irónica. Aposto que os publicitários não se lembraram desta possibilidade.

A foto é de autoria de Margaret Bourke-White e foi publicada na revista Life. 

quarta-feira, 19 de março de 2008

Mupi ou outdoor?


Este é o primeiro post deste blog. É um post de apresentação e, logo a abrir, damos com a cara do Ewan McGregor... Hum, até a mim me parece estranho, mas ainda assim sei que tem uma razão de ser. 
No outro dia, numa conversa com duas amigas leigas*, uma delas mencionou o "outdoor" do ewan mcgregor. Eu disse-lhe que não era um "outdoor", mas um mupi (não se trata da imagem aqui ao lado - o mupi é um rectângulo vertical). Obviamente, ela não quis saber. Na verdade, queria apenas mencionar como estava "boazudo" na dita publicidade.

Afinal quem quer saber como se chama a uma porcaria de uma peça de publicidade? Que lhes interessa o mupi, o flyer, o outdoor, o stand-up, a orelha, o stopper... e por aí fora! Não interessa mesmo nada. 
Mas interessa o "boazudo" do ewan mcgregor. Ou seja interessa a imagem que passa, a ideia que transmite. Vamos levando, pelo menos nos meios urbanos, com centenas de imagens diárias. Estamos expostos, estamos contaminados. E não há como ignorar.

Eu decidi que ia deixar de estar em negação. Na verdade, não sou leiga, mas também não sou pró-capitalista (mas sim o contrário) nem uma croma das publicidades, das imagens e dos layouts. Mas na verdade sinto que é meu dever deixar de ignorar essa realidade imagética que nos cerca diariamente. 

Porque, de alguma maneira, sinto que quanto mais dominarmos a sua linguagem, mais seremos capazes de não sermos influenciados por ela, capazes até de a alterar.

Este blog pretende ser crítico a falar de tudo o que me entra pelos olhos adentro. Com algum cuidado de não levarmos tudo demasiado a sério, porque penso que isso seria bem perigoso e chato - nunca se deve levar nada disto demasiado a sério, mas apenas as suas implicações. 

Por agora, é apenas isto e, entretanto, vamos vendo o que acontece. 


* neste caso chamo leigo a quem não é um profissional desta área da comunicação.