sexta-feira, 9 de abril de 2010

Um livro bolha-cósmico


Lucía Etxebarría é uma autora com visão do mundo. Uma visão que me agrada. Desde a desconfiança inicial que senti com um dos seus primeiros livros Amor, Curiosidade, Prozac e Dúvidas - os best-sellers têm esse efeito em mim - rapidamente me cativou assim que me dispus a abrir um livro dela e lê-lo. As suas reflexões sobre as mulheres, o seu feminismo moderno, descomplicado e directo, a sua ausência de preconceitos face à cultura "pop", da qual no fundo faz parte, o seu humor, foram algumas das qualidades que me conquistaram nesta espanhola com nome difícil de dizer.
Há uns sete/oito anos cruzei-me com ela numa fnac. Havia uma daquelas sessões de autógrafos e apresentação de livro (já não me lembro qual), mas devido a um erro no horário na agenda, não apareceu ninguém. Ela lá estava, rodeada com a agente e algumas pessoas da fnac, sentada numa das cadeiras do público a fazer colares de missangas. Na altura, fascinou-me a figura dela, o ar meio desalentado que tinha mas igualmente resignado e disposta a passar por aquilo fazendo mais um colar. Era cómico e doce, lá está. Assinou-me uns livros, trocámos umas palavras e falámos sobre o Caetano Veloso, concerto a que eu assistira na véspera e que ela gostaria de poder ver no concerto do mesmo dia. Enquanto falava comigo mantinha as missangas na mão. De algum modo, aquilo que ali aconteceu tinha tudo a ver com ela. Uma espécie de poesia do dia-a-dia sem grande charme, sem grande cosmética, muito real.
Diz-se realista. Há pouco, encontrei uma entrevista dela porque estava intrigada com este Cosmofobia, que me pareceu demasiado real, mas que depois me esclareceu sobre os seus fundamentos. Na entrevista, Etxebarría fala do seu realismo, daquilo que quer para o seu país, da sua filha e, agora, da sua incursão pela literatura infantil - acho que é uma tentação irresistível para os escritores que têm crianças na sua vida. E às tantas diz "Me gusta muchísimo bailar, creo que es lo que más me gusta en el mundo junto con escribir y hacer el amor." - e eu adoro estas coisas, porque unem a liberdade, a verdade e a alegria. Gosto deste seu realismo real em vez de negro ou simplesmente prosaico.
Etxebarría também é poeta, embora só conheça a sua poesia em castelhano, já que não há nenhuma poesia dela publicada em Portugal. Lembro-me que, até há pouco tempo, os seus livros vinham com uma manga com umas declarações dela numa entrevista em que dizia algo como "sou um ser absolutamente sexual". Acho que foi sempre nesse prisma que a tentaram vender por cá. Aborda a sexualidade de forma directa e fá-lo bem. Mas há muito mais que isso.
Bom, e agora o livro, não?
Não foi o livro que mais gostei dela, mas não deixa de ser cativante. A autora discorre sobre as histórias do seu bairro madrileno, Lavapiés, um "melting pot", em que só existe multiculturalidade e pouca interculturalidade. Com histórias cruzadas, que muitas vezes confundem o leitor, a obra no final marca esse ponto - o de mantas de retalhos em que poucas vezes as ligações são reconhecidas, pelos próprios actores da narrativa. Estamos todos ligados e todos ausentes e auto-excluídos dessa ligação.
O livro tem momentos muito fortes e leva-nos para a torrente das emoções humanas, para as dificuldades de viver e de nos relacionarmos. Como ela diz, na entrevista citada, são personagens que não encontram o seu lugar no mundo, que não se integram. À brutalidade de certas situações junta a magia do invisível noutras.
É isso que gosto nela, essa visão tão clara sobre o mundo, mas tão pouco dogmática e tão aberta a ele.

2 comentários:

Sandera disse...

;-.)


também gosto muito dela e gostava mais ainda era de lhe fazer as capas dos livros...nunca gosto de nenhuma graças a deus.

e tou quase quase quase a pegar naquele presente de natal! quase quase.

ana vicente disse...

ahahhahah!

acho que a capa original é bem melhor...

http://farm1.static.flickr.com/211/515117806_39355edbfc.jpg?v=0