Entretanto, tive acesso a algumas fotografias das molduras, antevendo aquilo que poderá ser a exposição. E, a partir delas, surgiram-me algumas reflexões, que vos deixo agora. Talvez sejam mais dúvidas para apontar um caminho possível.
Quando as vi, deparei-me de imediato com várias. Quanto de nós cabe numa moldura? Como tornar a identidade visível e percepcionada? Num certo sentido, esta é uma pergunta com que o espectador se poderá confrontar: como seria a minha moldura? Logo, como seria a minha identidade visível, o meu eu escondido revelado ou o meu eu conhecido exacerbado? Aquilo que queremos mostrar aos outros nem sempre pode ter esse carácter de construído. E nessa moldura cabe o construído que quero ser, o que quero que vejam ou o que sou realmente? Nestas dúvidas, compreendo que as fronteiras são invisíveis, que não há paredes estanques, nem divisórias entre eus vividos, eus sonhados e eus pensados. Que tudo é eu, mesmo aquilo que não conheço, principalmente o que não conheço, diriam alguns.
Enquanto isso, olhei cada uma das fotos em busca do significado de cada uma, esperando alcançar o eu de outra pessoa, através do seu olhar. Na verdade, perante as molduras, resta-nos espreitar. Espreitar fisicamente, ostensivamente, como não podemos espreitar ninguém, a vida de ninguém.
Neste duplo movimento de hipotética autora e hipotética espectadora, dei-me conta desta acção constante de nós com os outros. Aquilo que mostramos, aquilo que espreitamos - aquilo que se deixa espreitar e aqui que é inevitável que espreitemos. Na vida principalmente. A grande construção social da relação com os outros, da relação connosco próprios, de todas estas identidades que se misturam de uma forma tão pouco, ou tão muito, "emoldurável".
Escrevo este texto, perdendo-me um pouco em considerações vagas e teóricas, mas pensando sobretudo nestas molduras (que são vidas que nunca conhecerei) e em vidas (que são molduras que nunca conheceremos).
Resta espreitar com cuidado.